A demissão de Sabato De Sarno da Gucci marcou mais um capítulo turbulento na indústria. A saída aconteceu logo após a despedida de Kim Jones da linha masculina da Dior. Que instabilidade é esta?
Os resultados financeiros da Gucci foram um dos principais fatores para a saída abrupta de Sabato De Sarno da direção criativa da casa de moda italiana. A marca viu as suas receitas caírem 26% no terceiro trimestre de 2024, para 1,6 milhões de euros, um declínio alarmante para uma das mais lucrativas casas do conglomerado Kering. O desempenho abaixo do esperado reflete uma tendência preocupante na moda: o público não se identifica com as novas propostas criativas, e a estratégia de retorno à essencialidade parece não ter conquistado os consumidores.
A Kering enfrenta dificuldades para reverter a desaceleração do crescimento, especialmente em comparação com a rival LVMH, que tem conseguido manter um posicionamento mais estável, embora a Dior, parte do império LVMH, também tenha sofrido uma baixa significativa com a saída de Kim Jones, cuja passagem pela marca, à frente da direção criativa da Dior Men, foi marcada por um equilíbrio entre streetwear e alta-costura, mantendo a Dior relevante junto a um público mais jovem.
Mas a revolução não se limita à Gucci e à Dior. Recentemente, diretores criativos de grandes casas de moda foram substituídos. Por exemplo? Na Chanel, Virginie Viard, a sucessora de Lagerfeld, foi substituída por Matthieu Blazy, que deixou a italiana Bottega Veneta. A estreia de Matthieu Blazy à frente da Chanel será em outubro, na Semana da Moda de Paris. Com a saída de Blazy, a Bottega apostou em Louise Trotter, ex-Lacoste e ex-Joseph. Na Celine, por sua vez, Hedi Slimane foi substituído por Michael Rider, que regressa a casa após uma curta passagem pela Ralph Lauren. Na Lanvin, Bruno Sialelli despede-se para dar lugar a Peter Copping, que já passou por casas como Christian Lacroix, Louis Vuitton e Oscar de la Renta. Alberta Ferretti também se afasta da casa a que dá o nome, sendo substituída por Lorenzo Serafini, que apresenta a sua coleção de estreia em março. Mês onde iremos conhecer a primeira coleção de Haider Ackermann para a Tom Ford. Ackermann substitui Peter Hawkings, que esteve 18 anos à frente da marca.
O fator China e a mudança de paradigma
Um dos desafios mais evidentes é a volatilidade do mercado chinês, que tem sido um motor de crescimento para a indústria do luxo na última década. Com um consumidor cada vez mais cauteloso e um ambiente económico incerto, as grandes casas estão tendo dificuldades em manter as vendas. A desaceleração do turismo chinês na Europa também reduziu o volume de compras presenciais nas capitais da moda, como Paris e Milão.
A moda vive um momento de transição, e um dos aspetos mais discutidos é a mudança de paradigma na direção criativa. Nos últimos anos, o mercado apostou em designers visionários para revitalizar as marcas. O exemplo mais emblemático foi Alessandro Michele, cujo maximalismo colorido impulsionou a italiana Gucci para um sucesso estrondoso. No entanto, esse modelo de aposta em criadores autorais pode estar a chegar ao fim.
Os conglomerados de luxo parecem agora preferir estratégias mais comerciais e menos dependentes de um génio criativo. A abordagem pragmática de De Sarno, por exemplo, era focada em peças básicas e vendáveis, mas não conseguiu gerar o mesmo desejo que caracterizou a Gucci na era Michele. Da mesma forma, Kim Jones, conhecido pelo seu talento em colaborações e reinvenção do streetwear de luxo, também enfrenta o desgaste de uma fórmula que pode estar a perder impacto.
Com tantas mudanças a acontecer num curto espaço de tempo, é possível que a indústria esteja a entrar numa nova era. O desafio para os gigantes do luxo é encontrar um equilíbrio entre criatividade e estratégia comercial sem perder a identidade. A sustentação das marcas pode depender de um novo modelo de liderança criativa, possivelmente mais colaborativo, e de uma abordagem diferente às dinâmicas de mercado.
A próxima grande questão é: quem assumirá as posições vagas na Gucci e na Dior? E conseguirão estas mudanças estabilizar a moda destas casas num momento de tanta incerteza global?











