A importância de desenhar espaços com alma num mundo cada vez mais esteticamente uniforme.
Nos últimos anos, Lisboa, o Porto e outras cidades portuguesas têm-se transformado, e isso, em muitos aspetos, é motivo de celebração. A crescente atenção ao design, à qualidade dos espaços, ao detalhe e ao serviço elevou o nível da nossa oferta — colocando Portugal no radar internacional não só pelo seu património, mas também pela forma como se apresenta ao mundo.
Mas, à medida que essa modernização avança, é importante refletirmos: estamos a criar novos ícones ou a copiar fórmulas? A linha entre atualização e uniformização é cada vez mais ténue. Cafés, hotéis e restaurantes começam a adotar estéticas globais tão replicadas que os espaços perdem a sua voz própria — os mesmos tons e estilos, os mesmos brunches, os mesmos interiores “instagramáveis”. É bonito. É seguro. Mas será memorável?
Recentemente, tive o privilégio de intervir no projeto de renovação dos Pastéis de Belém — um lugar que, mais do que uma pastelaria, é um ícone da identidade portuguesa. Um espaço que resiste ao tempo, que guarda rituais e histórias, e que funciona como uma âncora cultural e emocional para várias gerações.
O que me inspirou não foram os turistas, nem a ideia de modernizar por modernizar. O que me moveu foi a história invisível daquela casa, que é muito mais do que os pastéis. É um lugar-ritual para lisboetas que ali vão há 30, 40 anos, sentando-se sempre na mesma mesa, pedindo o mesmo café, vivendo o mesmo momento — com tempo, com verdade.
Foi ao escutar essas histórias que compreendi que este projeto era sobre identidade. E que o verdadeiro luxo não está em seguir tendências, mas em preservar aquilo que nos distingue.
Na Viterbo Interior Design, a nossa missão é precisamente essa: desenhar com consciência, com contexto, com respeito profundo pela herança e pela verdade do lugar. Temos uma linguagem clássica e intemporal, mas sabemos integrá-la na contemporaneidade sem apagar a memória. O nosso trabalho não é só criar beleza — é proteger narrativas.
Lembro-me bem de uma das primeiras experiências da minha carreira: as montras da Hermès em Lisboa. Foi aí que aprendi, com os melhores, que tradição não significa rigidez. Significa raízes. E que só com raízes é possível crescer de forma autêntica.
O The Wolseley em Londres é um bom exemplo internacional desse equilíbrio entre o novo e o intemporal. Um espaço que se soube renovar sem perder grandeza, estilo ou alma. E é disso que precisamos mais em Portugal — e no mundo: projetos que não apaguem a identidade em nome da estética fácil.
Muito se tem refletido sobre o que torna um espaço verdadeiramente memorável: não é a estética da moda, mas a capacidade de resistir à pressa da uniformização. Porque quando tudo começa a parecer igual, tudo começa a não significar nada.
O design tem um papel político, cultural e emocional. Cabe-nos a nós — designers, arquitetos, marcas — decidir se queremos ser cúmplices da repetição ou guardiões da autenticidade. Eu escolho a segunda.
Gracinha Viterbo, designer de interiores







